Saúde
Fertilidade: um assunto de família
União no dia a dia é prioridade para driblar as adversidades e auxiliar a busca pelo filho
Foto: Divulgação - "Mudei meus hábitos, não foi fácil, mas realizei o sonho da minha vida", diz Jocasta Soares
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), uma a cada seis pessoas no mundo é diagnosticada com infertilidade. Estes dados documentam que o fator independe de classe social ou escolaridade.
Estima-se que de 10% a 15% dos casais enfrentam alguma dificuldade para engravidar, o que é definido quando não se consegue uma gestação após um ano de tentativas. Existem muitas causas que resultam na infertilidade, que podem atingir tanto mulheres quanto homens.
Existem os fatores do casal e os particulares de cada um que influenciam a fertilidade, além daqueles que são possíveis de controlar ou até mesmo evitar, que dizem respeito ao estilo de vida, exposição a substâncias, problemas de saúde, alimentação e histórico familiar. Dessa forma, se houver dificuldades na concepção, mesmo com uma rotina saudável, é essencial procurar a orientação de um especialista, ele é que poderá fazer o diagnóstico mais preciso da situação e, se necessário, indicar o tratamento adequado.
De acordo com o urologista Guilherme Locks de Loyola, a infertilidade masculina pode ser ocasionada por uma única doença como fator isolado, como no caso da varicocele, que se trata da dilatação anormal das veias testiculares, ou, ainda, pela combinação de vários fatores externos ou problemas de saúde. “Em muitos casos a fertilidade masculina está atrelada a hábitos não saudáveis e que são um marcador de saúde de forma global. Muitos homens acabam descobrindo outras patologias ao investigarem a fertilidade”, alerta.
Muito presente nas causas atendidas em consultório, Loyola relata que os maus hábitos de vida, tais como tabagismo, uso de anabolizantes, sedentarismo e até exercícios físicos em excesso podem ser causadores da infertilidade no caso dos homens. Também fazem parte dessa lista a obesidade, exposição a produtos tóxicos, poluição ambiental, estresse e má alimentação. “Importante frisar que, em casos mais leves, mudanças de hábitos podem trazer melhorias significativas. Outros necessitam de tratamentos clínicos, com uso de medicações, e ainda outros necessitam de tratamento cirúrgico. Tudo é minuciosamente analisado para cada paciente”, explica.
Quando procurar por um especialista?
Ao desconfiar de problemas relacionados à infertilidade, o homem deve procurar um urologista, de preferência que entenda de reprodução humana. Segundo Loyola, entre os exames solicitados estão o espermograma e as dosagens hormonais, para iniciar o processo investigativo. Estes irão avaliar a qualidade, quantidade e a forma dos espermatozoides. Já exames físicos e laboratoriais servem para analisar fatores que impedem a saída dos espermatozóides, referente aos problemas nos testículos e às disfunções hormonais. Todas as possíveis causas da infertilidade masculina deverão ser investigadas pelo especialista durante a consulta. “A avaliação é individualizada. Em casos de alterações, a investigação é ampliada com exames adicionais, além de analisar a história médica e exame físico. Sem a avaliação do fator masculino, não é possível estabelecer uma conduta adequada para o casal. Mesmo em casos onde o fator feminino é severo e que exista indicação de uso de técnicas de reprodução assistida, a avaliação do fator masculino visa otimizar os resultados”, comenta.
Já para as mulheres, a investigação inicia no consultório ginecológico, com acompanhamento dos exames de rotina e, após análise destes, é recomendado a consulta com um profissional que tenha conhecimento sobre reprodução humana e também questões relacionadas à infertilidade, para assim aprofundar as buscas e encontrar a causa.
Segundo a ginecologista e especialista em reprodução humana Lara Real, o fator feminino costuma estar mais presente entre aquelas com idade acima de 35 anos, período em que a taxa de ovulação começa a cair, reduzindo assim as chances de uma gestação. Mas esta não é a única e exclusiva condição. A ginecologista explica que é preciso estar atento a todos os detalhes que envolvem a vida daquela mulher, o histórico médico e familiar, os hábitos, há quanto tempo está tentando uma gestação e se tem uma rotina exposta a elementos que possam dificultar esse processo.
“Um dos motivos que também está causando muitos casos de infertilidade é porque as pessoas estão deixando para engravidar mais tarde, o que é normal, isso ocorre por terem outros planos à frente. O problema é que, desta forma, além de ter o fator idade, tem também o tempo que somos expostos aos disruptores endócrinos, que acabam dificultando e atenuando as questões referente à infertilidade e isso é algo difícil de driblar. Eles estão nos alimentos, nos cosméticos, nas embalagens... Ou seja, podemos reduzir a exposição e um dos fatores é não protelando mais ainda essa tentativa, senão será mais tempo em contato e menores as chances”, alerta.
Disruptores endócrinos
Bastante impactantes quando o assunto é fertilidade, são agentes e substâncias químicas que promovem alterações no sistema endócrino humano e nos hormônios. Costumam estar presentes em diversos produtos que são consumidos ou entram em contato com o organismo humano. É possível de se encontrar nos pesticidas, produtos eletrônicos, produtos de higiene pessoal, cosméticos, aditivos alimentares, derivados do plástico e em embalagens de produtos alimentícios. Na grande maioria não tem como evitar totalmente o contato, e neste caso entra o bom senso e tentativa de moderação o máximo possível.
Outro fator bastante importante para ambos é a questão da idade. Lara explica que cada mulher nasce e chega à puberdade com uma quantidade determinada de óvulos em seu organismo. Ou seja, não são repostos a cada ciclo menstrual. Dessa forma, a chance de concepção diminui com o tempo, principalmente a partir dos 35 anos. “Cada mulher nasce com uma reserva ovariana e, com o passar dos anos, essa reserva diminui tanto em qualidade quanto em quantidade, além de precisarmos levar em conta os disruptores endócrinos e tudo que o organismo é exposto o tempo todo. É preciso estar atento e, na medida do possível, evitar”, alerta.
Apesar de, no caso dos homens, ser diferente do ciclo reprodutivo das mulheres pelo fato de produzirem espermatozoides a vida toda, estudos mostram que a idade avançada pode influenciar na qualidade e quantidade. Quando isso começa a acontecer, há chance de comprometer a saúde dos fetos. ”A idade paterna importa, sim. Apesar de os homens, em teoria, permanecerem férteis ao longo da vida, os com mais de 40 anos, e se por ventura apresentarem alguma comorbidade, estão associados à maior incidência de desfechos desfavoráveis para gestação”, explica Loyola. As mudanças hormonais que acompanham o avançar da idade, por sua vez, podem influenciar na taxa de fertilidade, causando alterações genéticas também nos espermatozoides.
A questão é do casal
Um casal pode ser diagnosticado com problemas referentes à fertilidade quando, após 12 meses de relações sexuais sem utilizar de métodos contraceptivos, tem como resultado a ausência da gravidez. Neste caso, Lara orienta que a busca pelas respostas seja feita através de investigações no casal, e não atribuir as causas só à mulher ou ao homem.
“Alguns casos precisam de maior atenção. Uma paciente sem histórico algum de doença preexistente, abaixo dos 35 anos, que há um ano está em tentativa e não tem sucesso na gestação, precisa de um olhar atento para ela, para o marido e para combinação do casal”, alerta a especialista.
O urologista, também afirma que essa busca completa e investigação médica para avaliar o motivo da infertilidade é fundamental para que o resultado seja mais rápido e de sucesso. “Sem a avaliação do fator masculino, não é possível estabelecer uma conduta adequada para o casal. Mesmo em casos onde o fator feminino é severo e que exista indicação de uso de técnicas de reprodução assistida, a avaliação do fator masculino visa otimizar os resultados”, explica Loyola.
Mudanças no estilo de vida
De maneira geral, ter um hábito de vida saudável possui impactos positivos na fertilidade, tanto para os homens quanto para as mulheres. Praticar exercícios físicos regularmente, ter uma alimentação balanceada, evitar o consumo de álcool e cigarros, além de buscar formas de enfrentar o estresse causado na rotina do dia a dia, são alguns hábitos saudáveis que possuem impactos positivos na vida de qualquer pessoa. Isto não é diferente na das que buscam concretizar o sonho de serem pais.
De acordo com a nutricionista Pâmela Silva Vitória Salerno, especialista em fertilidade, gestação e saúde da mulher, mesmo que a pessoa tenha tido uma rotina desregrada até então, sem uma atenção e variedade nutricional, bem como ausência de exercícios físicos, ao aplicar as mudanças é possível perceber facilmente o bem-estar que a nova rotina traz aos pacientes, bem como os resultados positivos para processo de fertilidade.Seja natural ou assistida.
“Os benefícios já podem ser sentidos logo no início, entre o terceiro e sexto mês o organismo já mostra mudanças e, com isso, o processo de melhora.” Pâmela explica que, assim como todo tratamento para fertilidade, seu acompanhamento também segue um atendimento personalizado, onde na primeira consulta os futuros pais são avaliados de forma individual, prescritas dietas e devidas reposições quando necessárias.
Já nas consultas seguintes, o atendimento é em conjunto, seguindo até o final da gestação e, se necessário, inclusive após o nascimento do bebê. “É preciso que exista uma sintonia e uma cumplicidade entre o casal. A mudança do estilo de vida e os novos hábitos são para os dois. Não tem sentido somente a mulher ou o homem mudar, esse é um processo dos dois”, ressalta.
A nutricionista alerta ainda que, assim como o sedentarismo é prejudicial, a prática esportiva de forma demasiada também pode trazer prejuízos. “É preciso existir um equilíbrio, nada pode estar em excesso.Nem o peso, nem os exercícios e tampouco o uso de vitaminas ou suplementos. É preciso que haja muito cuidado e orientação especializada para tudo”, alerta.
Neste cuidado de restrições alimentares, a nutricionista salienta que alguns alimentos ajudam neste processo em busca da fertilidade enquanto outros devem ser evitados. Isso ocorre porque uma grande quantidade de vitaminas e minerais são processados pelos organismo, diminuindo a disponibilidade desses nutrientes para promover a produção de hormônios.
Em contrapartida, alimentos que aumentam a fertilidade são aqueles que ajudam na qualidade dos hormônios sexuais, óvulos e espermatozoides, como alimentos ricos em zinco, vitamina B6, ácidos graxos, ômega 3 e 6 e vitamina E. Portanto, para aumentar a fertilidade de homens e mulheres, a nutricionista recomenda incluir na dieta frutas secas, aveia, frutas cítricas, ovos, leguminosas, folhas verdes, peixes gordurosos, como salmão e atum, azeite e sementes.
Um exemplo de impacto negativo ao organismo está no tabagismo. De acordo com a nutricionista, as substâncias presentes no cigarro são bastante nocivas para o organismo e podem causar, nas mulheres, aceleramento da menopausa, disfunções ovarianas e até perdas gestacionais. Já nos homens, alterações diretamente ligadas à qualidade dos espermatozoides.
“Uma rotina pouco saudável, alimentação pobre em nutrientes e rica em gorduras e açúcares, sem atividades físicas, alto índice de estresse e com consumo de álcool e cigarros possui impactos negativos na fertilidade tanto feminina, quanto masculina, pois altera o metabolismo a ponto de interferir nos processos ligados à reprodução”, explica Pâmela.
Outro cuidado diz respeito ao excesso de peso que, além de complicações para saúde, afeta a produção hormonal e, no caso das mulheres, com efeitos na capacidade de recepção do endométrio.
Existem diferentes tipos de tratamento, sejam eles cirúrgicos, medicamentosos ou ainda técnicas laboratoriais, no caso da reprodução humana assistida. Mas qualquer uma das opções deve ser avaliada e recomendada pelo médico que irá acompanhar durante o tratamento.
Reprodução assistida
É importante esclarecer que se a infertilidade for confirmada, poderão ser estudados os melhores caminhos para ultrapassar as barreiras e chegar a uma gravidez. Nesse sentido, a mudança do estilo de vida também é um aliado para se ter sucesso nas diferentes técnicas de reprodução assistida, conforme explica a ginecologista. “Após analizar todo o cenário, a questão da idade, as tentativas e as mudanças, além de todas as adaptações já realizadas pelo casal, podemos orientar pela FIV, isso vai depender de cada caso além da vontade deste casal.Mas onde tivermos 1% de chance, iremos tentar”, afirma Lara.
Fertilização In Vitro
A Fertilização In Vitro (FIV), é uma das técnicas de reprodução assistida de alta complexidade que tem ajudado milhares de pessoas a superarem problemas de infertilidade. Ela consiste na fecundação, que é o encontro do espermatozóide com o óvulo em laboratório, daí a origem da denominação “In Vitro”. Desta forma, o embrião formado a partir da união dos gametas é posteriormente transferido ao útero para ser gestado.
Acompanhamento precoce, um passo para bons resultados
Estar em conexão com o seu corpo e com o seu parceiro é fundamental para enfrentar o percurso, que muitas vezes pode ser longo, para chegar à tão desejada gestação. Para Jocasta Soares dos Santos, essa foi uma peça chave. Além de descobrir de forma precoce que teriam que passar por esse processo, encontrou no marido uma conexão muito importante para juntos viverem a realização da maternidade e paternidade por meio da fertilização.
Após algumas tentativas com 28 anos, Jocasta percebeu que algo não estava dentro do esperado. Mesmo sem fazer uso de métodos contraceptivos por três anos, ela e o marido chegaram à conclusão que era hora de buscar ajuda especializada. “Estávamos tentando já há algum tempo, éramos bem jovens, sempre quis ser mãe cedo e esse tempo foi passando e começamos a perceber que não era algo normal. Para quem está idealizando e sonhando com a maternidade, receber a notícia que não seria possível, pela nossa combinação enquanto casal, é muito triste”, conta.
Ela relata que, a partir do diagnóstico, buscou profissionais que poderiam auxiliar no processo e que, além da ginecologista e do urologista, contou também com uma nutricionista e acompanhamento com atividade física para o casal. “Estávamos acima do peso, precisávamos de uma dieta e fizemos. Logo no início já sentimos a diferença. Eu percebia as mudanças no meu corpo, não só as que se vê no espelho. Eu emagreci bastante, em quatro meses eu era outra pessoa, reeduquei minha alimentação e aprendi a colocar a atividade física na minha rotina.”
Ainda assim, o casal precisou realizar a gestação por meio de FIV, mas Jocasta explica que a equipe médica que lhe acompanhou afirma que a mudança no seu estilo de vida foi fundamental para a qualidade da gestação que teve, assim como no parto e na recuperação. “Tive uma gestação muito tranquila, com cuidados básicos como toda gestação de gêmeos, mas cheguei até o final sem restrições. Foi um processo lindo e tranquilo. Meu marido foi muito meu parceiro em tudo que foi preciso mudar e adaptar. Quero seguir cuidando da minha saúde para aproveitar os meus bebês”, afirma.
Suporte psicológico essencial
Quando um casal decide engravidar e por algum motivo não consegue, é comum surgirem sentimentos de frustração, desânimo e culpa. Essa é uma questão que aflige principalmente os que estão na tentativa há mais tempo. Muitos ficam sem saber por onde iniciar os atendimentos, o que fazer, qual médico e quando procurar. As pessoas afetadas pela infertilidade sofrem com ansiedade, estigmas por todo processo enfrentado e, em alguns casos, dificuldades financeiras em virtude do alto custo do tratamento. Um outro problema são os danos à saúde mental e ao bem-estar desses homens e mulheres.
Para Carolina dos Santos Mattar, psicóloga especialista em reprodução humana, estar bem assistido, não só clinicamente, é fundamental. Ela explica que a parte emocional do casal e de cada um fica muito abalada por questões individuais e também que dependem de ambos. “O meu objetivo é auxiliar as pessoas a viverem essa jornada de uma forma mais adaptativa. Além de ser um processo que demanda muito da parte de investigação, de tratamento, nem sempre se tem um resultado satisfatório no primeiro momento, em alguns casos demora mais a chegar aos resultados”, comenta.
A psicóloga alerta que o diálogo entre o casal é fundamental para que se sintam em sintonia, fortificados e assim possam pesquisar e planejar com calma sobre os tipos de tratamento que pretendem e possam ser feitos. “Realmente é uma jornada intensa que alguns enfrentam. É necessário entender de onde vem esse desejo de filhos, se conhecer, conversar bastante sobre esse assunto, mas sem cobranças e pressões. Meu trabalho, além de auxiliar na compreensão dos próximos passos vividos por esse casal, às vezes atuo auxiliando na comunicação entre os médicos e os pacientes.Através disso, trabalho muitas vezes com a psicoterapia.”
Carolina enfatiza que é importante que o casal tente levar uma vida mais leve, curtindo os momentos a dois, já que a saúde mental e física de ambos influencia muito no momento da reprodução, mesmo quando realizada de maneira assistida. “Alguns casais que acabam indo para uma reprodução assistida optam em passar pelo processo sem dividir com ninguém, mantendo assim em sigilo. Aquilo fica só entre o casal. Mas, às vezes, é bastante complicado para eles, tendo que atender e acolher um ao outro, ter uma ajuda profissional com quem contar e se sentir apoiados é essencial”, orienta.
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